publico@publico.pt - 29 abr. 00:11
A Ordem dos Advogados e os desafios da Justiça
A Ordem dos Advogados e os desafios da Justiça
Uma justiça que exclui a advocacia é uma justiça mais fraca e um Estado que ignora o papel dos seus advogados é um Estado (cada vez) menos democrático.
A tomada de posse dos novos órgãos da Ordem dos Advogados, no próximo dia 8 de Maio, marcará o início de um novo ciclo.
Não se trata apenas de uma mudança interna, antes representa, sobretudo, uma oportunidade para reafirmar, com clareza, o papel da advocacia na defesa do Estado de Direito, da justiça e da democracia.
Com efeito, a Ordem dos Advogados é uma instituição com história, densidade e um mandato constitucional claro: assegurar o exercício livre e digno da advocacia e defender os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Essa missão é, hoje, mais exigente e necessária do que nunca.
Vivemos, assuma-se, tempos difíceis.
Desde logo porque a justiça está sob pressão intensa — pressionada pelos prazos, pela escassez de meios, pela desconfiança social e por reformas legislativas que, demasiadas vezes, ignoram a realidade do dia a dia dos seus agentes.
No meio desse cenário, estão os advogados: protagonistas de um sistema que, paradoxalmente, tende a empurrá-los para a margem, quando os devia preservar enquanto “garantes do Estado de Direito”.
De facto, uma justiça que exclui a advocacia é uma justiça mais fraca e um Estado que ignora o papel dos seus advogados é um Estado (cada vez) menos democrático.
Por isso mesmo, este novo mandato deve ser vivido com um sentido claro de responsabilidade: a Ordem dos Advogados não é apenas um espaço de regulação interna, é, cada vez mais, um lugar de intervenção pública.
Pelo que a advocacia, mais do que nunca, tem de ser presença ativa no debate nacional sobre a justiça, garantindo que o essencial não está apenas na defesa de prerrogativas ou de condições de trabalho. Está, sobretudo, na garantia de que o sistema funciona, que é acessível, que é compreensível, que responde às necessidades dos cidadãos e que protege, desde logo, os mais frágeis.
Para isso, é fundamental assegurar que quem serve o sistema o pode fazer com dignidade. Desta forma, a ausência de proteção social continua a ser uma das doenças que corroem, silenciosamente, a nossa profissão. Isto porque a advocacia vive sem rede, não beneficiando de proteção adequada na doença, na parentalidade, na velhice. As advogadas, em particular, enfrentam dificuldades que revelam o desequilíbrio estrutural do sistema — a maternidade continua a ser penalizada na prática forense, com perdas de rendimento, de clientela e de futuro. Não é admissível que assim seja e cada dia que se perde é um dia a menos na defesa da dignidade da advocacia.
A maternidade continua a ser penalizada na prática forense, com perdas de rendimento, de clientela e de futuro. Não é admissível que assim seja e cada dia que se perde é um dia a menos na defesa da dignidade da advocacia
Não se pode pedir entrega sem garantir amparo, não se pode exigir responsabilidade a quem não tem direitos, não se pode construir uma Justiça eficaz com uma advocacia desprotegida! Urge atuar, com coragem e com visão, protegendo a advocacia e a Justiça, sustentando a democracia e garantindo o Estado de Direito.
Neste novo ciclo, a Ordem deve assumir o seu papel institucional com firmeza, participar ativamente nos processos legislativos, reivindicar melhores condições para o apoio judiciário, denunciar práticas que comprometam o contraditório, combater a procuradoria ilícita e reforçar a formação e a ética profissional — não como exercício retórico, mas como exigência concreta.
Importa também pensar o lugar da advocacia no espaço europeu e no novo contexto digital. A inteligência artificial, a litigância em massa, os serviços jurídicos automatizados — tudo isso levanta questões sérias, que exigem uma resposta articulada, técnica e institucional.
A Ordem não deve limitar-se a reagir. Deve propor. Deve liderar. Deve intervir com clareza e sem hesitações.
Uma advocacia mais forte é o primeiro passo para uma justiça mais eficaz!
Uma justiça mais eficaz é a base de um Estado de Direito mais robusto!
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico