observador.ptObservador - 29 abr. 00:10

E as tarifas pah!?

E as tarifas pah!?

Há que definir com clarividência qual o papel que queremos para Portugal na Europa e no mundo e de que forma nos podemos salvaguardar e estar preparados para todos os riscos e ameaças que se avizinham

Finalizado o ciclo de debates entre os candidatos a primeiro-ministro para estas eleições legislativas, há várias análises que se podem retirar do visto, revisto, ouvido e percecionado.

Já vem sendo normal ouvir-se que os debates não ganham eleições, o que até poderá ser verdade, mas a perceção dos eleitores sobre os candidatos e as ideias que trazem para as campanhas são bastante escrutinadas nestes momentos televisivos. De igual modo, também o embate ideológico entre os vários partidos é bastante mais percetível e interessante de analisar do que na própria campanha eleitoral, em que se discute, essencialmente, a capacidade de mobilização de militantes e simpatizantes e soundbytes.

Não se pode dizer que os debates tenham sido o pináculo da política portuguesa, mas também não se pode dizer que tenham sido muito maus. Entre alguns bons debates, mudanças de postura e técnicas interessantes, algumas desilusões e momentos que nunca mais iremos recordar, houve de tudo e para todos os gostos.

O que se estranha, mas não se entranha, é a falta de atenção sobre o atual contexto mundial e as respetivas movimentações geopolíticas por parte da generalidade dos políticos portugueses. Se por um lado o alheamento do cidadão comum é muitas vezes desculpável, por toda a vida que nos absorve diariamente, por outro a nossa classe política deveria estar bastante mais atenta, a debater e propor medidas para o que se irá passar nos próximos tempos a nível mundial e que terá seguramente um forte impacto na vida de todos os portugueses. Nesse sentido, estes últimos debates televisivos foram, infelizmente, uma oportunidade perdida.

Um dos temas que deveria estar na ordem do dia em todos os debates políticos é o programa de tarifas aduaneiras de Donald Trump, assim como a sua posição em relação ao papel que os EUA devem ter a nível de soft power em várias regiões do globo, uma vez que irá mudar radicalmente o mundo tal como o conhecemos hoje. Não só teremos, por um lado, uma disrupção total de toda a cadeia produtiva e comercial devido à aplicação destas tarifas, que se poderão estender entre vários blocos de comércio como forma de adaptação e normalização ao que os EUA estão a implementar, como também está à vista de todos o surgimento de uma Nova Ordem Mundial.

As Tarifas

A implementação de novas tarifas aduaneiras entre os vários blocos comerciais vai gerar um aumento generalizado dos preços, inflação, que nada mais são do que impostos que todos teremos de pagar a mais sobre o consumo que efetuarmos. Esta situação irá levar a que os Bancos Centrais voltem a repensar a sua estratégia de redução de juros que vinha a ser trilhada, o que poderá penalizar ainda mais os créditos, sobretudo os de habitação.

Para além dos problemas óbvios que as aplicações indiscriminadas destas tarifas trazem para todo o comércio mundial e para todos os cidadãos com a respetiva inflação, existem 2 variáveis que foram acrescentadas ao comércio internacional.

A primeira variável é a da imprevisibilidade sobre o futuro. Os mercados ficaram completamente nervosos e ainda estão a tentar encontrar um ponto de equilíbrio com o que se irá passar, levando a uma adaptação das suas estratégias. Como é lógico, esta incerteza, o principal inimigo do investimento, levará a uma possível recessão a nível mundial, que está cada vez mais próxima.

A segunda variável que foi acrescentada foi o free pass que os EUA deram à China para se que tornem na 1.ª economia a nível global e que possam dar mais um passo rumo à sua hegemonia mundial. Os EUA sempre foram muito cautelosos sobre os planos hegemónicos da China e sempre conseguiram retardar ao máximo os seus planos de domínio comercial. Porém, a aplicação de tarifas aduaneiras norte-americanas faz com que a China se torne um mercado apetecível, por troca direta, para blocos como o europeu, não só pela redução de tarifas alfandegárias, como também pela previsibilidade do mercado chinês e pelo seu avanço tecnológico.

O domínio comercial da China pode ter sido bem acelerado com a eleição de Donald Trump e nós portugueses devemos pensar muito bem como nos posicionar sobre este tema, correndo o risco de continuarmos estagnados a nível industrial e de desenvolvimento tecnológico. Sem dúvida alguma que os planos de Xi Jinping para a Nova Rota da Seda, já lançada em 2013, estão mais reforçados do que nunca com a atual conjuntura mundial e é isso que devemos debater: as implicações que essa expansão comercial terá a nível nacional e europeu.

Nova Ordem Mundial

A par do domínio comercial e tecnológico, a China tem hoje o domínio sobre uma Nova Ordem Mundial que começa a surgir com vários países com regimes autocráticos ou mesmo ditatoriais a encabeçá-la. Estando atentos ao que se tem passado com a expansão territorial e domínio marítimo tanto no Mar da China Oriental como Meridional, verificamos que estamos a entrar numa era de conquistas territoriais, em que a lei internacional vale cada vez menos face a poderosos arsenais. Já é uma realidade e já o observamos em várias geografias, as fronteiras e domínios territoriais atualmente são demasiado voláteis e há claramente um retrocesso civilizacional inegável, procurando determinados blocos uma hegemonia sobre outros, em que os recursos naturais são sempre o principal interesse.

Observamos países como Espanha, que nas últimas semanas iniciaram conversações com a China primeiro e logo de seguida com os EUA, procurando o melhor dos 2 mundos. Vemos países como Itália a terem um papel fulcral entre o bloco europeu e o americano.

Portugal e a nossa classe política têm de definir com clarividência qual o papel que querem para Portugal na Europa e no mundo, e de que forma nos podemos salvaguardar e estar preparados para todos os riscos e ameaças que se avizinham nos próximos tempos, vindos de várias geografias.

O mundo mudou e Portugal tem de se adaptar rapidamente a estes novos tempos, sob pena de total irrelevância na cena internacional.

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