sol.sapo.ptJoana Andrade - 29 abr. 12:38

O Matuto e os Candidatos

O Matuto e os Candidatos

todos os candidatos parecem ao Matuto como bonecos de palha, inchados de ar e promessas, mas balofos. Só se mexem se alguém puxar os cordelinhos.

O Matuto não se entusiasma com política. E muito menos com politiquices. A última vez que o Matuto sentiu o vermezinho da política foi com a Professor Cavaco nos comícios da Alameda Dom Afonso Henriques. Hoje, Discursos ensaiados, cara de meninos da mamã, hipocrisia quanto baste. Um desfile de horrores.

A Belinha, a visita conservadora da ‘Casa das Pontes’ – o Matuto imagina que votaria PSD ou IL – diz: “É uma dança e contradança. Cada um com o seu passo, os mesmos gestos, as mesmas palavras, e no final do dia, quem se lembra da coreografia? O povo? Não. O povo, coitado, já se esqueceu das promessas feitas nas últimas eleições. Porque desde que haja futebol e samba, está tudo tranquilo”. O Matuto acha uma certa piada que uma Brasileira seja tão certeira em questão de política Portuguesa. 

O Marcello, a visita reaccionária das ‘Pontes’ – talvez votasse PS – é mais corrosivo: “Essa esquerda Portuguesa é muito ‘chique”. Preocupados com banheiros (casa de banho, em Portugal, por favor) inclusivos. E querendo criar um SUS (Serviço Nacional de Saúde, em Portugal, por favor) para animais! Isso é besteira! Bobeira completa! Antes disso é preciso liberar os trabalhadores…” O Matuto acha piada (hoje, o Matuto acha piada a tudo. Deve ser do tempo!) a estes arroubos neo-Marxistas.

Verdade verdadinha, é que o Matuto sabe de fonte segura que este teatro tem raízes bem antigas, mais precisamente no tempo dos Romanos – os antigos Italianos. Estes privilegiavam o uso da toga. O povo romano orgulhava-se de se chamar gens togata – o povo da toga – enquanto os ‘bárbaros’ se riam desta vestimenta pesada. Que terá isto a ver com as eleições!? Pois, estimado leitor, o curioso é que as togas eram geralmente brancas… na verdade branqueadas. Eram alvas, claras, níveas, nevadas, cândidas, alabastrinas. Alvas como a neve, cor de leite. E aqui vem a ironia: o Matuto sabe de fonte segura que a palavra moderna “candidato” vem do latim candidatus, que significa “branqueado”. Isso mesmo, “branqueado”! E quem é que usava togas especialmente branqueadas durante as campanhas eleitorais? Os candidatos, claro. Eles estavam lá, todos brancos e brilhantes, tentando impressionar os eleitores com a perfeição de sua indumentária. A toga branca era quase um símbolo de pureza política, de inocência virginal. O Matuto não resiste a considerar que os candidatos de hoje são uns “branqueados”. Sepulcros caiados.

Entretanto, o Matuto lembra-se duma história apócrifa. Certa vez, um candidato a senador romano, chegou à praça com uma toga imaculada e com aquele sorriso de quem promete este mundo e o outro. O povo, claro, aplaudia de pé, com os olhos brilhando, imaginando as promessas a acontecerem num piscar de olhos. No entanto, quando o candidato passou perto de uma criança, ela disse: “Oh, senhor, a sua toga tem um buraco.” O candidato, envergonhado, olhou para baixo e, não querendo perder a compostura, tentou tapar o buraco com as mãos. Tarde piaste! O buraco já tinha sido visto. E o povo, que antes aplaudia, riu-se baixinho, como quem diz: “O rei vai nu”. O buraco sempre aparece. Não importa o quão branqueada tenha sido a toga.

E, para rematar, o Matuto deixa um aviso à navegação. Cuidado com os candidatos que interpelam os eleitores como “Portugueses”. Em histórias de antanho o Matuto até sabe quem eram esses “Portugueses”: Camões, Eça de Queiroz, Martim Moniz, Dom Diniz, Vergílio Ferreira, Eduardo Prado Coelho… Há um halo de poeira que anula imperfeições e realça melhor as cores desse Portugueses. Hoje, isso nada significa. Um Português, será uma pessoa vulgar que arrota alto, ouve música pimba e passeia de fato de treino pelo shopping ao fim de semana. Portugueses a sério, estão em extinção; há, isso sim pessoas que habitam em Portugal.

Por isso o Matuto duvida muita das intenções dos candidatos. O que seria bom era que as pessoas morressem suavemente e vivessem dignamente. Que as pequenas misérias fossem erradicadas e que houvesse menos gente candidata, e mais gente sensata. Menos pessoas dadas ao espalhafato, e mais focadas num civismo pacato. Será pedir muito!? – matuta o Matuto.

NewsItem [
pubDate=2025-04-29 13:38:52.0
, url=https://sol.sapo.pt/2025/04/29/o-matuto-e-os-candidatos/
, host=sol.sapo.pt
, wordCount=677
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2025_04_29_131430323_o-matuto-e-os-candidatos
, topics=[opinião, opiniao, matuto]
, sections=[opiniao]
, score=0.000023]