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Administração Trump demite autores de relatório climático fundamental

Administração Trump demite autores de relatório climático fundamental

Governo norte-americano suspende contratos dos investigadores que trabalhavam na Avaliação Nacional do Clima, publicado a cada quatro ou cinco anos para documentar as alterações climáticas nos EUA.

A Administração Trump informou aos cientistas responsáveis pela elaboração de um relatório sobre o clima encomendado pelo Congresso norte-americano que os iria “dispensar” das suas funções e que o âmbito do relatório estava a ser reavaliado. A dispensa foi comunicada na segunda-feira por email, segundo informação confirmada pelo jornal The Washington Post.

Centenas de autores que contribuem para a Avaliação Nacional do Clima (NCA, na sigla em inglês) — um relatório que documenta as alterações climáticas nos Estados Unidos, publicado a cada quatro ou cinco anos desde 2000 — irão suspender o trabalho no próximo relatório, cuja publicação estava prevista para 2028. O relatório poderá ser adiado, redigido de forma a minimizar as alterações climáticas ou nem sequer ser elaborado, explicam especialistas em clima.

“Não ter a NCA é como conduzir um carro com o pára-brisas sujo”, afirma Chris Field, professor de estudos ambientais na Universidade de Stanford. “Tal como conduzir com o pára-brisas sujo, é difícil detectar os riscos até que estes se revelem como desastres”, alerta.

O email da Administração Trump não especifica o que acontecerá com o próximo relatório da NCA, limitando-se a dizer que “poderá haver oportunidades futuras” para os cientistas e especialistas até agora envolvidos em que possam “contribuir ou participar”.

As principais funções da NCA incluem analisar as alterações ambientais, projectar o que se espera nos próximos 25 a 100 anos e fornecer informações localizadas para cada região dos Estados Unidos. Os utilizadores incluem as forças armadas dos EUA, equipas de emergência, agricultores, empresas privadas e o Governo dos EUA.

A Casa Branca não deu resposta ao pedido do Washington Post para comentar o assunto.

Fim do Gabinete de Alterações Globais

A medida surge depois de a Administração Trump ter cortado o financiamento do Programa de Investigação sobre Alterações Globais dos EUA, que supervisiona e coordena a elaboração e publicação do relatório. Os responsáveis da Administração Trump cancelaram um contrato com uma empresa que faz a articulação com a maior parte do pessoal do programa.

O Washington Post tinha noticiado anteriormente que o cancelamento desse contrato pela Administração Trump tornaria difícil, se não impossível, para o Gabinete de Alterações Globais produzir a próxima Avaliação Nacional do Clima, que continua a ser exigida pelo Congresso nos termos da Lei de Investigação sobre Alterações Globais de 1990.

A comunicação de segunda-feira revelada aos investigadores, em conjunto com a rescisão do contrato com a empresa, significa que “literalmente não há ninguém” para fazer este trabalho, afirma Mijin Cha, professora de estudos ambientais da Universidade da Califórnia em Santa Cruz e uma das cientistas demitidas.

A elaboração da NCA, explica Mijin Cha, é um processo de três anos que requer investigação rigorosa. “Sem a equipa e muitos voluntários, este trabalho não seria possível”, explica.

Credibilidade em causa

Jane Lubchenco, ecóloga marinha que esteve em serviço durante os governos dos presidentes Barack Obama e Joe Biden, afirma temer que o Governo de Trump publique o seu próprio relatório e o use para justificar o desmantelamento da regulação climática existente.

“O poder da Avaliação Nacional do Clima vem da sua credibilidade — credibilidade porque os seus autores são especialistas reconhecidos e porque o relatório é revisto por pares das academias nacionais de ciência, engenharia e medicina”, respondeu a investigadora ao Washington Post. Um relatório elaborado por funcionários da Administração Trump que não tivesse “essas salvaguardas” seria “visto como uma piada”, explica.

Durante o seu primeiro mandato, Donald Trump levantou suspeitas de que o seu Governo estava a tentar limitar a divulgação da Avaliação Nacional do Clima de 2018, ao divulgá-la no dia seguinte ao Dia de Acção de Graças.

Essa avaliação, assim como a mais recente da NCA, divulgada em 2023 pela Administração Biden, alertou os norte-americanos sobre os efeitos cada vez mais mortais das alterações climáticas, embora as emissões dos EUA tenham diminuído desde o pico atingido em 2007.

Diana Furchtgott-Roth, directora do Centro de Energia, Clima e Meio Ambiente da Heritage Foundation, elogiou o Governo por “dar uma nova vista de olhos aos relatórios da NCA”, considerando que as avaliações anteriores defendiam a transição para emissões líquidas em carbono, o que ela considerou “nem desejável nem realista”, e não discutiam quaisquer benefícios dos combustíveis fósseis.

Chris Field, cientista climático de Stanford, reforça que o Governo deveria continuar com a avaliação, afirmando que essa seria a “medida inteligente e eficiente a ser tomada”.

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

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