sol.sapo.ptsol.sapo.pt - 29 abr. 12:59

Tarifas EUA. O que dizem os principais exportadores

Tarifas EUA. O que dizem os principais exportadores

O grau de incerteza continua a ser elevado, mas os principais setores exportadores já fazem ‘contas à vida’ ao impacto que as tarifas americanas poderão ter nas suas atividades.

Apesar de a economia portuguesa estar sobretudo dependente das exportações para a União Europeia, as tarifas anunciadas por Donald Trump causam impacto. Esta semana, Paul Krugman, Nobel da Economia, considerou que Portugal está mais exposto do que a média da União Europeia. Esse risco «está relacionado com as várias características estruturais da economia portuguesa», considera Paulo Monteiro Rosa, economista do Banco Carregosa.


Ao Nascer do SOL, o responsável lembra que as exportações para fora do espaço comunitário têm um peso mais limitado, com os EUA a representarem cerca de 6,7% do total. «Apesar de não se tratar de uma parte considerável no contexto global das exportações portuguesas, os EUA são, ainda assim, o principal destino extracomunitário, o que confere alguma relevância estratégica, sobretudo em setores como o têxtil, calçado, cortiça, vinho e componentes automóveis que podem ser particularmente sensíveis a alterações tarifárias», admite.


No entanto, reconhece que Portugal tem uma capacidade de resposta mais limitada face a choques externos quando comparado com economias maiores como a Alemanha ou a França, «que beneficiam de um mercado interno bem mais amplo e robusto, capaz de absorver com maior facilidade aquilo que não é escoado para o exterior», acrescentando ainda «que dispõem de uma maior margem fiscal e de instrumentos mais eficazes para mitigar os impactos de eventuais tarifas impostas por uma administração como a de Trump».


E chama a atenção para o alerta de Krugman, que apontou o dedo à menor diversificação da economia portuguesa. «Em cenários de aplicação de tarifas a setores específicos, como o automóvel ou o têxtil, países com economias menos diversificadas são mais vulneráveis a perdas significativas de competitividade, investimento e emprego». Ao mesmo tempo, destaca o risco associado à forte integração de Portugal nas cadeias de valor globais, já que um aumento de tarifas poderá «levar à perda de contratos ou à deslocação de produção para outros países», refere Paulo Monteiro Rosa.

Mais expostos
Paulo Monteiro Rosa reconhece que há setores mais expostos ao aumento de tarifas comerciais norte-americanas do que outros, e acena com os que têm maior vocação exportadora para mercados extracomunitários, como os EUA. Um deles diz respeito ao têxtil e ao vestuário, assim como o calçado, «todos fortemente dependentes das exportações e integrados em cadeias de valor globais».


A Associação Têxtil e Vestuário de Portugal já alertou que estas tarifas vindas dos EUA vão ter «um impacto significativo nos negócios» das empresas do setor. Mas por esta altura ainda é difícil quantificar as perdas. «Estamos ainda numa fase inicial deste processo e persistem muitas incertezas quanto à forma como os diferentes países visados irão reagir a estas medidas», acrescentando, no entanto que «haverá perdas para o setor, mas neste momento é difícil quantificar com precisão o seu impacto. Trata-se de um setor muito diverso e complexo, com níveis de dependência do mercado norte-americano que variam significativamente de empresa para empresa e de produto para produto».


O mesmo cenário antevê-se na cortiça e no vinho, considerados «produtos emblemáticos portugueses com elevada procura no mercado norte-americano», como diz o economista do banco Carregosa. No seu entender, são setores que enfrentam «riscos acrescidos, podendo perder competitividade, ter contratos cancelados ou a produção deslocalizada para outros países».


Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal, revela que assim que surgiram rumores da ameaça do avanço das tarifas, muitos produtores de vinho anteciparam-se e mandaram o produto para seis meses de consumo. «Isso foi possível com as empresas mais organizadas e as que tinham condições, daí os Estados Unidos terem sido o principal mercado de exportação português do vinho no primeiro trimestre deste ano. As empresas anteciparam-se porque estando no no negócio, não estão a dormir, nem podem porque caso contrário perdem dinheiro», revela ao Nascer do SOL.


É certo que o responsável reconhece que o nível de incerteza continua a ser muito elevado. «Só podemos desenhar uma medida quando conhecermos o impacto que as tarifas vão ter e ninguém consegue saber se a tarifa é 10, 20 ou 30, se é daqui a 90 ou a 150 dias. Trump diz num dia que é 200% e no outro dia já não é», mas afasta o cenário de termos de ir ‘correr’ à procura de novos mercados. «Vamos à procura de mercados para onde? Para Marte?», questiona. E lembra que «as pessoas que vendem vinho vendem no mundo inteiro».


Quanto ao impacto que poderá ter, também há dúvidas: «Uma pessoa que compra um vinho caro se aumentar 10% vai deixar de comprar? Acho que não e quem compra barato também não irá ter quase impacto». E lembra que os operadores podem levar a cabo determinadas ações. «Se o aumento da tarifa for de 10%, 5%, o produtor encaixa e os outros 5% serão encaixados pelo exportador», salienta.


Já Frederico Falcão, presidente da Vini Portugal diz que os EUA foram, em 2024, o nosso segundo maior mercado em valor, muito encostado à França que cresce por causa do vinho do Porto. Segundo o responsável, os EUA têm uma quota de mercado de 10,78% e, até fevereiro, os Estados Unidos foram o principal país em valor. E, apesar de dizer que, o mercado americano está a importar menos, afirma que Portugal está a conquistar terreno, daí acreditar que quaisquer tarifas que venham ou outro tipo de barreiras que possam vir, «naturalmente são muito prejudiciais».


E face a cenários aponta: «Aqueles 200% seriam uma tragédia, seriam uma verdadeira tragédia porque iríamos perder o mercado quase todo. O mercado não iria desaparecer, mas quase. 20% era muito mau, 10% não é assustador», confessa.


Frederico Falcão nota ainda que tudo o que se diz em relação às tarifas tem que ser muito cauteloso, uma vez que ainda nada é certo. «Neste momento, aparentemente, temos alguma estabilidade. Temos uma tarifa de 10% e com uma suspensão de 90 dias para a negociação com a União Europeia». E afirma que «a grande maioria das encomendas foram desbloqueadas, os vinhos já estão a caminho dos Estados Unidos, alguns até já lá chegaram. As coisas estão a andar, está tudo desbloqueado e existe uma tarifa real de 10%».


Questionado sobre se têm tido algum contacto do Governo português, Frederico Falcão é perentório: «Zero». Pelo menos no que diz respeito ao Ministério da Agricultura. Da parte do Ministério da Economia houve um contacto, uma vez que chamou várias associações. «Ouviu-nos, mas informação do lado de lá sobre o que é que vão fazer não sabemos nada».

Empresários poucos otimistas
Os dados não são animadores. De acordo com os últimos números do inquérito realizado pela Associação Empresarial de Portugal (AEP), quase metade (46%) das empresas admitem que vão sentir efeitos negativos diretos nos seus negócios com o gigante americano e mais de metade (54%) dizem que os efeitos indiretos serão significativos ou muito significativos para a sua atividade comercial. Outro indicador interessante diz respeito aos ajustes de preços e custos, em que apenas 18% dos inquiridos pensam ser uma estratégia a adotar, ao contrário da diversificação/ redirecionamento dos mercados, que é encarada como caminho a seguir para mitigar os efeitos dos aumentos das tarifas por 46% das empresas.

Solução à vista
Paulo Monteiro Rosa recorda que Krugman chamou a atenção para o facto de Portugal pertencer à União Europeia representar «uma rede de segurança», uma vez que, entende «que o bloco atua de forma conjunta face ao protecionismo, com capacidade para negociar, reagir e apoiar os países e setores mais afetados». Ainda assim, o economista do banco Carregosa refere que «embora Portugal beneficie do enquadramento europeu, encontra-se relativamente mais exposto a choques comerciais do que a média dos países da União, o que justifica uma atenção especial às tendências do comércio internacional e às dinâmicas protecionistas».

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