observador.ptobservador.pt - 29 abr. 21:20

Fact Check. Obama criou departamento de eficiência estatal que Trump entregou a Elon Musk?

Fact Check. Obama criou departamento de eficiência estatal que Trump entregou a Elon Musk?

Publicação na internet sugere que foi Obama a criar o "DOGE", gabinete de eficiência anunciado por Trump e através do qual a administração norte-americana pretende cortar em despesa e funcionários.

As redes sociais estão a ser palco de uma nova polémica gerada em torno do departamento de eficiência norte-americano, redinamizado pela administração Trump para fazer face a alegados gastos desnecessários na administração pública dos Estados Unidos. Desta vez, circulam publicações que sugerem que o gabinete já existia, tendo sido iniciado por Barack Obama — Presidente dos EUA entre 2009 e 2017 — e que Donald Trump se limitou a alterar o nome do organismo.

Numa das publicações em causa pode ler-se que “Trump e Musk não criaram nada. Obama é que criou. Obama criou o United States Digital Service (USDS) em 2014. Era para ser um remendo burocrático para corrigir o colapso do site Obamacare [um programa legislativo de reforma na Saúde para facilitar o acesso a cuidados médicos]. Avançando para 2025, Trump muda-lhe o nome para DOGE (United States DOGE Service). Mantém o acrónimo, mantém o financiamento, mas dá-lhe uma missão totalmente nova […] Obama criou o DOGE, e Trump está apenas a capitalizar à conta disso”.

DOGE — o fantasma dos funcionários públicos

Já antes de tomar posse, Donald Trump tinha avançado que iria nomear o multimilionário Elon Musk para chefiar o “DOGE”, o novo departamento de eficiência governamental dos Estados Unidos, uma entidade que, apesar de não pertencer oficialmente ao Executivo do Presidente, foi criada para gerir os gastos na função pública (cortando despesas consideradas desnecessárias), assim como para reduzir a burocracia e reestruturar as agências federais.

Quando Trump anunciou o novo órgão, garantiu que havia mais de 6,5 mil milhões de dólares de despesa anuais no setor público, pretendendo reduzir pelo menos um terço desse valor, embora não tenha explicado como pretendia fazê-lo. Engrandecido pela escolha de Trump, o dono da Tesla assegurou que iria cumprir a função com máxima transparência, deduzindo os gastos apenas em setores com elevado desperdício. Elon Musk garantiu, então, que não se tratava de uma ameaça à democracia mas sim à burocracia.

Threat to democracy?

Nope, threat to BUREAUCRACY!!!

— Elon Musk (@elonmusk) November 13, 2024

A fazer parelha com Elon Musk na liderança do DOGE esteve, inicialmente, Vivek Ramaswamy, um empresário republicano, que defendeu o fim do departamento de Educação, o FBI e o departamento de receita federal, responsável pela cobrança de impostos. E ainda antes da campanha presidencial norte-americana, que deu a vitória a Trump, afirmou publicamente que o número de trabalhadores públicos ao nível federal deveria ser cortado em 75%.

Esta administração norte-americana está em funções há pouco mais de três meses, mas o departamento DOGE já provocou algumas consequências. No caso dos imigrantes, as suas informações confidenciais que constam no sistema  de Justiça norte-americano passaram a poder ser acedidas por Elon Musk e restante equipa, segundo avançou o Washington Post.

De acordo com o jornal norte-americano, através do DOGE, o executivo de Donald Trump está a usar dados pessoais protegidos para encontrar imigrantes documentados e indocumentados, para saber onde eles trabalham, estudam e vivem, muitas vezes com o objetivo de retirá-los de suas casas e dos locais de trabalho.

E não ficam por aqui os constrangimentos. No final de fevereiro, uma das ordens da equipa liderada por Musk  bloqueou os cartões de crédito de funcionários de agências federais durante um mês e proibiu o pagamento de viagens de trabalho “não-essenciais”. Para justificar a decisão, Marco Rubio, secretário de Estado norte-americano, emitiu uma nota pública a explicar que era apenas o início dos cortes nos gastos em “contratos, subvenções e empréstimos, para garantir a transparência das despesas públicas e a responsabilização dos funcionários públicos perante o público norte-americano”.

Entre os contratos na mira de Musk para cessarem, estão os dos escritórios ocupados pelas agências federais. Centenas destas agências podem abandonar as sedes até ao próximo verão, uma vez que o empresário considera que desperdiçam dinheiro público. Por isso, é previsível que os contratos sejam sujeitos a rescisão — é o que consta em documentos da Administração de Serviços Gerais norte-americana. Entre as agências em risco está a de Receita Federal, a Administração da Segurança Social, o Departamento de Agricultura dos EUA e o Serviço Geológico dos EUA.

Há outras consequências da administração Trump através do DOGE, mas uma das medidas que gerou mais protestos em todo o mundo foi o anúncio do fim da USAID, a agência governamental de ajuda humanitária e desenvolvimento internacional dos Estados Unidos. Com menos de duas semanas no cargo, Elon Musk assumiu que a USAID teria de fechar, e para isso teve a aprovação de Donald Trump. Mais tarde, Marco Rubio afirmou que há várias funções da agência que se vão manter “fazendo parte da política externa dos Estados Unidos”.

A origem da nova polémica

Na génese da alegação que agora corre nas redes sociais está um artigo escrito pelo advogado Tom Renz, intitulado “DOGE – A Lawyer’s Perspective”.  Renz é um advogado cujas afirmações já foram alvo de vários Fact Cheks, devido a informações falsas que divulgou, em particular durante a pandemia de Covid-19 a pretexto  dos efeitos secundários das vacinas, ou ainda uma teoria da conspiração em como Joe Biden teria escondido milhares de mortes na sequência do vírus. Portanto, este advogado é conhecido por espalhar informações falsas na internet.

No texto do artigo aqui em análise, Tom Renz escreve que “Trump NÃO criou realmente uma nova agência. O que ele fez foi redirecionar uma agência existente — o USDS — para algo mais útil”. Nesta senda, o advogado aproveitou também para publicar, no X, um post em que afirma que o “USDS era um escritório da Obamacare criado para melhorar o software do governo”.

The USDS was an Obamacare office created to make government software better. They were essentially software development for the bureaucracy. Trump renamed the United States Digital Service (USDS) the United States DOGE Service which even kept the acronym the same. Not only did… pic.twitter.com/Pl7kRTn1Vz

— Tom Renz (@RenzTom) February 5, 2025

É uma afirmação enganadora. Obama fundou, em 2014, o USDS para eliminar os problemas no site healthcare.gov e definiu como objetivo claro “melhorar continuamente os serviços governamentais críticos” de forma a criar uma melhor experiência digital para cidadãos e empresas. O mesmo foi garantido no site da Casa Branca, durante a administração Obama.

Dez anos depois, no dia 13 de agosto de 2024 e sob a liderança de Joe Biden, a Casa Branca emitiu um comunicado em que enaltecia os serviços prestados pela USDS ao serviço das agências federais e da população norte-americana: “Inicialmente formado como uma equipe de resposta a crises para enfrentar os desafios de entrega de serviços, o USDS evoluiu desde então para um parceiro confiável para mais de 30 agências federais – trabalhando diretamente com elas para fornecer serviços superiores ao público e construir capacidades digitais para o futuro”. Um exemplo desses serviços foi parte da resposta à pandemia de Covid-19 em que, juntamente com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças foram criados sistemas de dados de apoio a departamentos de saúde pública.

Já Donald Trump, quando assumiu a presidência da Casa Branca, em janeiro deste ano, explicou em comunicado que o Serviço Digital dos Estados Unidos – USDS, iria ser reorganizado e renomeado publicamente como Serviço DOGE dos Estados Unidos. Só que o espectro de atividades deste órgão passou a ser mais alargado, concentrando-se também no corte de despesa pública e na redução de burocracia.

Conclusão

É verdade que tinha sido Barack Obama a criar o gabinete de eficiência governamental USDS, em 2014, e que foi agora renomeado por Trump. No entanto, o organismo criado pelo antigo Presidente norte-americano tinha como foco o desenvolvimento da tecnologia em prol de um melhor funcionamento das plataformas das instituições públicas ao serviço dos cidadãos e das empresas.

Em janeiro deste ano, depois de tomar posse, Donald Trump admitiu que alterou a designação do USDS. No entanto, o DOGE, além de manter o trabalho desenvolvido anteriormente, foca-se num maior número de serviços, em particular, regulamentação e fiscalização de agências, com vista ao corte de despesa e de burocracia. Portanto, é enganador dizer que o gabinete criado por Obama tenha sofrido uma alteração de nome, com uma missão totalmente nova. O DOGE inclui os antigos serviços prestados, assim como atividades adicionais.

ENGANADOR

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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