observador.pt - 29 abr. 19:56
Dezenas de elevadores pararam devido ao apagão. Alexandre salvou uma jovem que ficou presa três horas
Dezenas de elevadores pararam devido ao apagão. Alexandre salvou uma jovem que ficou presa três horas
Ao volante da carrinha da empresa de elevadores, Alexandre viu uma mulher esbracejar para lhe pedir ajuda a retirar a amiga presa há três horas. Liga dos Bombeiros diz que ninguém ficou sem resposta.
Alexandre estava a fazer uma inspeção rotineira num elevador de um prédio às 11h33 quando as luzes se apagaram. Tinha acabado de deixar entrar um morador, com o qual seguia para o rés-do-chão, e o primeiro pensamento foi que, apesar de ter tido todos os cuidados necessários, pudesse ter provocado alguma avaria.
Não ficaram presos “porque não calhou” e rapidamente conseguiram sair, deparando-se no exterior do prédio com os primeiros sinais do apagão que atingiu Portugal, Espanha e algumas zonas de França: luzes e semáforos desligados, e pessoas à espreitar às janelas em busca de um motivo. Horas depois e a caminho de casa o funcionário de uma empresa de elevadores, estava a ser parado no meio da estrada por alguém que pedia ajuda para retirar uma jovem presa há mais de três horas.
Esse foi apenas um de dezenas de casos que ao final da manhã de segunda-feira foram chegando às linhas de emergência de empresas de elevadores e às corporaç��es de bombeiros. Alguns resgates foram dificultados pela instabilidade nas redes de comunicação e pelo “caos” nas estradas, relatou ao Observador a AG Eleva, empresa de manutenção de elevadores que opera na Grande Lisboa, e que fez 36 desencarceramentos num dia. Segundo o presidente da Liga dos Bombeiros de Portugal, foi possível “responder a todos os pedidos.”
“Como é evidente, essas situações foram mais nas áreas urbanas do que nas áreas do interior do país. Mas não temos registo de nenhuma situação em que houvesse pânico”, explica ao Observador António Nunes, sem conseguir precisar o número de ocorrências, afirmando apenas que foi na ordem das dezenas. Em Espanha os elevadores também foram um problema. Só em Valência, por exemplo, os bombeiros que trabalham na região realizaram 80 resgates.
O resgate em “20 segundos” de uma jovem presa mais de três horas num elevadorA empresa em que Alexandre trabalha respondeu a vários incidentes durante o início da tarde de segunda-feira. Num primeiro momento pós-apagão, explicou num áudio enviado ainda na segunda-feira �� Rádio Observador, todos os funcionários receberam ordens para ir para casa de modo a poupar combustível e baterias de telemóvel para estarem disponíveis nos casos de emergência. Estava precisamente a regressar a casa na carrinha do trabalho, facilmente identificável pelos logótipos, quando viu uma mulher a “esbracejar” na sua direção, no centro de Vila Nova de Gaia.
“Abrando e pergunto se está tudo bem e se é para mim que está a querer falar, quando ela, aproximando-se, me diz que está uma pessoa presa num elevador há mais de três horas”, contou. Seguiu-a logo para o interior de um prédio e, de mochila às costas e lanterna na mão, subiu até ao quarto andar, onde uma jovem de cerca de 20 anos estava presa.
O caso pareceu-lhe fácil de resolver, explicou em maior pormenor ao Observador esta terça-feira. “Vi que aquilo estava uns 20 a 30 centímetros acima do piso. A senhora que estava no elevador até conseguiria sair sozinha se soubesse”, refere, para logo acrescentar que nestes casos, “quem não sabe não mexe”. “Não sabendo é melhor não fazer nada para não se aleijar.”
A jovem estava “muito tranquila” ao contrário dos amigos que a esperavam cá fora. “Eu disse-lhe para ter calma, que era como se fosse um degrau. Ela disse logo: ‘Estou bem. Os meus colegas é que estão completamente stressados, já estava a enlouquecer com eles aqui à porta.”
Apesar de o elevador não ser da sua empresa, e estando perante uma situação de emergência, Alexandre, que também é escuteiro e socorrista, pôs mãos à obra. Em “20 segundos”, a jovem estava cá fora. No final enviou uma mensagem a um conhecido da empresa a que pertence o elevador para o avisar do caso.
“O nosso dia hoje está a ser pior que ontem”Ao contrário deste episódio, em que a jovem ficou mais de três horas a aguardar um resgate, a Liga dos Bombeiros de Portugal garante que as corporações agiram com bastante prontidão. Das dezenas de pedidos que receberam, a maior parte foi solucionada entre uma hora e meia e duas horas. “Diria que naquelas duas horas seguintes [ao apagão] todos esses casos foram resolvidos.”
António Nunes refere que as equipas de bombeiros responderam a ocorrências principalmente em prédios, já que infraestruturas como hospitais ou centros comerciais têm geradores de emergência que à partida podem alimentar os elevadores para garantir que ninguém fica encarcerado.
Os bombeiros responderam entre as 11h30 e as 20h00 de segunda-feira a mais de 2.200 ocorrências, segundo indicou a Proteção Civil num comunicado enviado às redações. A contagem não discrimina o tipo de incidentes e, até ao momento da publicação deste artigo, o organismo não respondeu às perguntas do Observador sobre o número de casos relacionados com pessoas presas em elevadores.
A AG Eleva, por exemplo, disse ao Observador ter realizado 36 operações de desencarceramento. Num dia normal, é raro acontecer uma ocorrência e no máximo, são três por semana. “Durante um tempo os telefones ainda funcionaram e as pessoas começaram a ligar, mas rapidamente as linhas ficaram saturadas ou deixaram de funcionar”, recorda Maria Garcia, gestora comercial da empresa de manutenção e reparação de elevadores.
“Em condições normais alguém liga e nos enviamos o técnico que está mais próximo do local e mantemos comunicação com a pessoa, para a tranquilizar e avisar do progresso da pessoa. Ontem não foi tão fácil porque não conseguimos falar de volta com os clientes. Eles faziam a chamada, nós confirmávamos e pouca comunicação havia depois”, conta, acrescentando que os contactos se fizeram essencialmente pela linha de apoio por WhatsApp.
A responsável da AG Eleva explica que todos os técnicos da empresa, mesmo os que estão focados nas áreas de reparação e manutenção, foram mobilizados para os resgates em elevadores. A maioria dos dencarceramentos aconteceram em Lisboa, em zonas em Marvila e junto à Almirante Reis.
Num dia normal, entre a comunicação do problema e a chegada ao local passam “30 minutos, no máximo”, explica. Na segunda-feira foi superior, em alguns casos até 50 minutos no caso de prédios que ficavam no centro de Lisboa. “O trânsito estava caótico. O mais difícil foi conseguir chegar aos locais.” Esta terça-feira, porém, o trabalho está a ser muito mais intenso: ao final da manhã tinham mais de 60 elevadores parados, o que atribui a um mau funcionamento devido ao apagão. “O nosso dia hoje está a ser pior que ontem.”