Observador - 30 abr. 00:05
Europa - Que caminho?
Europa - Que caminho?
A Europa tem de cessar a destruição da sua própria economia ao abrigo de causas duvidosas, de abandonar o romantismo de quem acha que vai resolver todos os males do mundo!
Paris, 18 de abril de 1951, local e data que assinalam a formalização do primeiro ato para a construção da Europa de espaço comum que hoje partilhamos. O Tratado CECA (Comunidade Europeia do Carvão e do Aço) ou Tratado de Paris, evidencia pela primeira vez o empenho de um conjunto de países, num processo de integração em formato de comunidade. Mas mais que isso, demonstra a perceção dos seus promotores, que numa Europa saída de duas grandes guerras, a união deveria constituir a base essencial na construção do nosso futuro comum.
Os subscritores do tratado, visionários e movidos por indiscutível espírito pioneiro, deixavam muito claro que este significativo e arrojado passo, seria o primeiro, no sentido de uma união económica e política, na construção de uma Federação Europeia.
Foi esse o desígnio inicial da causa europeia, se não formalmente assumido, pelo menos no sonho daqueles que, como Jean Monnet, Jacques Delors ou Helmut Kohl, se foram empenhando no projeto, unindo países num espaço de democracia, de liberdade e de bem sucedido desenvolvimento económico.
Entretanto, a causa primeira foi-se esbatendo, numa Europa tendencialmente dividida e deficitária em políticos de dimensão transnacional, entretida entre regulações, burocracias e causas perdidas, que se vai tornando cada vez mais pequena e inaudível, até ao momento não muito distante, em que, persistindo neste caminho, contará para coisa nenhuma.
É num contexto de desunião acelerada e evidente incapacidade em concertar objetivos comuns, que a voz corrente da generalidade dos políticos europeus, começa a assumir um discurso assente nas “rápidas mudanças” que ocorrem no espaço global, situando-as num período temporal muito curto e enfatizando as questões de segurança. Falam agora de união e na necessidade de um exército europeu, ou pelo menos, de uma política comum de defesa. Esquecem-se porém, que as mudanças que impactam no tempo presente são bem mais vastas e começaram a acentuar-se há mais de 50 anos atrás. Ainda assim, a perceção de uma nova realidade, poderá constituir a oportunidade para recuperar um trajeto que nos recoloque numa posição geopolítica e económica relevante.
Não é só de um exército europeu e de assegurar a sua própria defesa que a Europa precisa. Antes de tudo, é urgente que saia da utopia político-sociológica em que está embrenhada, despertando para uma realidade que insiste não querer perceber.
Somos hoje um continente economicamente estagnado, que nos últimos 60/70 anos saiu da era colonial, perdendo o controlo e a gestão dos recursos de uma vastíssima área geográfica. Um território que é pobre em recursos naturais e sobretudo energéticos.
Nesse mesmo período, assistimos à consolidação da supremacia americana, ao crescimento da influência da China, à degradação económica da Rússia, mas não do seu poderio bélico. Mais recentemente, percecionamos o crescimento dos mercados asiáticos emergentes e as movimentações económicas do Brasil e da India, inquestionavelmente países de elevado potencial.
Apesar de tudo isso, soubemos perceber que só com dimensão poderíamos ombrear com estes novos mercados, sendo essa a razão principal em que a U.E. justifica e estrutura a sua própria existência. Esta capacidade de compreender o mundo e de antecipar a realidade, que perdemos e importa recuperar, permitiu-nos criar uma era que é, numa perspetiva histórica, uma das mais bens sucedidas no que respeita à paz, liberdade, democracia e padrões de desenvolvimento económico. Qualquer exercício, ainda que académico, de desintegração da U.E., resultará num acentuado empobrecimento da maioria dos países que a constituem.
Mas as vantagens competitivas que suportaram esta era de desenvolvimento, assentes no engenho e numa ideia de vida que se tornou altamente vendável, estão a perder impacto e a Europa tem de se reinventar, sob risco de se tornar num velho, patético e falido nobre, que inebriado pela sua vaidade, desperta demasiado tarde para o que lhe está a acontecer.
Não é só de uma política comum de defesa que a Europa precisa.
Necessita, acima de tudo e drasticamente, de doses elevadas de pragmatismo!
De cessar a destruição da sua própria economia ao abrigo de causas duvidosas, de abandonar o romantismo de quem acha que vai resolver todos os males do mundo!
Mas sobretudo, é urgente que comece a falar e a decidir a uma só voz!
Podemos, e devemos, continuar a ser um player de relevo no xadrez mundial. Manter o estatuto de paladinos dos valores de que nos orgulhamos, do humanismo, do ambiente, da cooperação, da democracia, da liberdade.
Mas temos de perceber a importância do equilíbrio entre as causas que queremos assumir e a realidade com que nos deparamos. Se perdermos a capacidade financeira e fragilizarmos o nosso poder político, numa permanente obsessão por utopias, seremos apenas uma voz aos berros que ninguém ouvirá, sem capacidade de ter uma ínfima parte de influência no que quer que seja.
O mundo continuará em profundas mudanças! Ou percebemos as novas realidades e nos adaptamos, unidos e pragmáticos, numa união politica e económica mais robusta, ou insistimos num processo de perda e deixamos simplesmente de contar.