www.publico.pt - 30 abr. 05:00
Cartas ao director
Cartas ao director
E se fosse um cataclismo?
O “apagão” permitiu testar a resposta dos serviços a um cataclismo. Verificou-se que a maioria dos serviços essenciais não tiveram geradores com fuel-oil suficiente, as operadoras telefónicas falharam, o SIRESP falhou, a Protecção Civil não arrancou, como não arrancaram as centrais eléctricas que estavam desligadas para poupar. Não se ouviram, nas primeiras horas, nenhumas mensagens à população, sossegando-a e informando-a, mas as fake news circularam. A população não está apetrechada para aguentar situações como a do “apagão”, pois não tem nem reservas de dinheiro em contado, nem comida para uma semana, nem mesmo gasolina tinha o automóvel. Há quem afirme que não correu muito mal, mas com um cataclismo tudo será bem pior. Há muito para corrigir imediatamente, pois uma catástrofe não espera os resultados dos relatórios das comissões que o Governo irá pôr a trabalhar.
Ricardo Charters-d’Azevedo, São Pedro do Estoril
Apagão moralPensei que as memórias da pandemia de covid-19, nomeadamente as cenas de milhares de portugueses a açambarcar bens essenciais, jamais se repetissem. Bastaram algumas horas de um apagão eléctrico para esse egoísmo voltar em força. Já fomos um país de corajosos descobridores, agora só existem cidadãos medrosos que querem encontrar o caminho mais rápido para esvaziar a prateleira de um supermercado ou conquistar o combustível da bomba mais próxima. Foi também um apagão moral, o colapso da sociedade actual, o "salve-se quem puder" contrário ao bem comum, adivinhando-se tempos bastante escuros para o futuro.
Emanuel Caetano, Ermesinde
Faça-se luzA electricidade é uma coisa fantástica, viaja à velocidade da luz, mas a energia não se acumula, é necessário sincronismo absoluto entre a produção e o consumo. Quando alguém liga um interruptor em casa, algures uma central de produção estará instantaneamente a responder e a entregar esses watts… Por isso, a gestão das redes e do parque produtor é um desafio muito exigente. Juntando a variabilidade da produção solar ou eólica e a inflexibilidade de regime de algumas centrais como as nucleares, mais complexa é a gestão.
Relativamente ao famoso apagão desta semana, mais do que o “disse que disse”, o “fez não fez a lojinha” ou como o viveu aquele dia o senhor António ou a dona Maria, parece-me fundamental esclarecer o seguinte: quando Espanha diz que desapareceu “subitamente” 60% da produção/consumo de energia, isto não é uma causa primária, mas a consequência de outra coisa, que foi…? As redes eléctricas têm sistemas de deslastre, que devem funcionar à velocidade da luz, ou quase, para evitar um colapso. Porque falharam aqui?
Aparentemente, teremos apenas duas centrais que podem arrancar autónomas, todas as outras só “pegam de empurrão”. Porquê apenas duas e porque foi necessário esperar seis horas para carregar no botão? Havia um plano de contingência preparado? Pilotar um avião em modo automático e em céus tranquilos é muito fácil. Será que “estamos preparados” para enfrentar tempestades e imprevistos? Diria que não…
Carlos Sampaio, Esposende
Abate de centraisO apagão histórico veio pôr a nu as razões por que estamos dependentes de energia eléctrica. Em primeiro lugar, porque tudo é um negócio e comprar energia ao estrangeiro não faz parte de uma estratégia de autonomia de Portugal, mas sim decisões dos actuais decisores estrangeiros, donos da electricidade portuguesa.
Em segundo lugar, foi mais fácil abater centrais termoeléctricas, como a central a carvão de Sines, a central termoeléctrica do Lavradio-Barreiro, a central termoeléctrica do Pego e as centrais termoeléctricas do Carregado (duas). Resumindo, estamos a falar de cinco centrais, abatidas sem que nenhuma fosse reposta, o que significa que, em termos de consumo, ficamos dependentes das decisões, boas ou más, dos actuais donos da electricidade em Portugal.
Investir em novas centrais mais modernas seria uma opção inteligente, mas os investidores não entenderam assim. Quem fala politicamente em manter centrais a carvão é, do meu ponto de vista, um papagaio político barato, sem saber do que fala.
Na altura em que foram abatidas estas cinco centrais, se o capital social estivesse na mão de proprietários portugueses, tenho quase a certeza de que tinham tomado a melhor opção – construir (duas novas) centrais de ciclo combinado, em localidades a definir, e isso seria suficiente para repor a auto-suficiência energética em Portugal, sem necessidade de compra ao estrangeiro. (…)
José Ribeiro, Vale da Amoreira