rr.ptrr.pt - 18 jun. 18:00

Mónica Sousa: "É o financiamento necessário para a imaginação ser o limite"

Mónica Sousa: "É o financiamento necessário para a imaginação ser o limite"

A cientista portuguesa Mónica Sousa, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) acaba de ser distinguida pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC - European Research Council, com uma bolsa de 2,5 milhões de euros. A imaginação será "o limite" na investigação de novas terapias para lesões na medula espinhal, em humanos.

A maioria dos compêndios de biologia "dizem que os mamíferos não são capazes de regenerar, em particular, o sistema nervoso central". Esta é, contudo, uma tese desmentida pela descoberta do "ratinho espinhoso africano (Acomys Cahirinus), um roedor pequenino que consegue, de uma forma espontânea, regenerar o sistema nervoso após lesões muito severas". E Mónica Sousa decidiu perceber porquê. O seu projeto de investigação pretende "perceber os mecanismos, e quais as células que este mamífero, em especial, é capaz de utilizar para fazer aquilo que nenhum outro mamífero é capaz de fazer".

Em fim de linha, explica à Renascença esta cientista portuguesa, "se formos bem sucedidos, este tipo de informação poderá ser utilizada para modificar mamíferos que não regenerem, incluindo o homem, e ver se eles poderão adquirir capacidade regenerativa".

Esta será, como sempre acontece, uma investigação demorada, que avançará passo a passo: "Se ao fim destes cinco anos formos bem-sucedidos, poderemos estar prontos para dar o próximo passo. E nunca iremos modificar humanos. Vamos modificar um animal muito parecido com o ratinho espinhoso, que é o ratinho comum, que não regenera à semelhança dos humanos, e ver se um ratinho comum modificado, já é capaz de regenerar".

Nesse caso, admite: "Poderemos pensar na utilização destas possíveis terapias, em humanos".

Quanto à bolsa de 2,5 milhões de euros, que acaba de lhe ser atribuída, Mónica Sousa não tem dúvidas: "O impulso é imenso (...) Durante cinco anos vamos poder trabalhar com o financiamento necessário para a imaginação ser o nosso limite, não é?"

Que investigação é esta, que acaba de lhe valer uma bolsa do Conselho Europeu de Investigação?

Nós encontramos o primeiro mamífero que é capaz de regenerar espontaneamente o sistema nervoso central. O que é que isto quer dizer? Portanto, a regeneração em mamíferos — como é o caso do homem - é muito limitada ou inexistente. E quase todos os livros de texto, normalmente, de biologia, dizem que os mamíferos não são capazes de regenerar, em particular, o sistema nervoso central.

Por isso é que as lesões e as doenças do cérebro, da medula espinhal, muitas vezes são vistas como doenças que estão quase para além da intervenção terapêutica...ou as lesões no cérebro e na medula espinhal. E aquilo que encontramos foi um mamífero específico, que é o ratinho espinhoso africano. Portanto, é um roedor pequenino que consegue, de uma forma espontânea, regenerar o sistema nervoso após lesões muito severas. O projeto baseia-se em perceber os mecanismos, e quais as células que este mamífero, em especial, é capaz de utilizar para fazer aquilo que nenhum outro mamífero é capaz de fazer.

Na prática, em que é que isso pode traduzir um avanço científico que permita curar ou tratar problemas, quer ao nível cerebral, quer da medula espinhal, no ser humano?

Ora bem, este projeto é muito centrado na medula espinhal e é, também, um projeto muito básico. Portanto, nós queremos encontrar um mapa de células, de processos, que permitam a este animal regenerar.

Com certeza que no futuro, e se formos bem sucedidos, este tipo de informação poderá ser utilizada para modificar mamíferos que não regenerem, incluindo o homem, e ver se eles poderão adquirir capacidade regenerativa.

Isso seria um sucesso... mas, como acontece habitualmente na ciência, um sucesso só a longo prazo?

Exatamente, exatamente. A ciência é lenta. Isto é um projeto de cinco anos...portanto, se ao fim destes cinco anos formos bem sucedidos, poderemos estar prontos para dar o próximo passo. E nunca iremos modificar humanos. Vamos modificar um animal muito parecido com o ratinho espinhoso, que é o ratinho comum, que não regenera à semelhança dos humanos, e ver se um ratinho comum modificado de forma a ficar mais semelhante com o ratinho espinhoso, já é capaz de regenerar. Então, se isso acontecer, poderemos pensar na utilização destas alterações, portanto destas possíveis terapias, em humanos, mas isso sim será sempre mais tarde.

Entretanto, esta sua investigação recebeu uma bolsa avultada (do Conselho Europeu de Investigação) de 2 milhões e meio de euros. Que impulso é que isto pode dar a esta investigação?

O impulso é imenso. Primeiro liberta-nos dos constrangimentos do financiamento nacional. Durante cinco anos vamos poder trabalhar com o financiamento necessário para a imaginação ser o nosso limite, não é?

Vamos poder cumprir um projeto que é muito ambicioso, que envolve uma quantidade de experiências bastante grande e que seria muito difícil de financiar noutro tipo de circunstâncias.

Portanto, vamos ver como é que acontece o desenvolvimento embrionário deste animal, da medula espinhal; vamos ver de que forma é que a medula espinhal adulta é, ou não, capaz de recapitular o desenvolvimento após lesão; vamos estudar outros ratinhos mais próximos do ratinho espinhoso para tentar perceber quando, durante a evolu��ão, nasceu ou apareceu esta capacidade regenerativa; vamos sequenciar células da medula espinhal individualmente para perceber os seus mecanismos individuais... Portanto, de facto, é um projeto complexo, ambicioso e que envolve um investimento grande que fora do contexto do financiamento da União Europeia seria difícil de concretizar.

Numa frase, dinheiro não há problema, exista imaginação...

Exato.

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