Observador - 19 jun. 00:13
Entre 70% e 80% das empresas portuguesas são familiares
Entre 70% e 80% das empresas portuguesas são familiares
É importante voltar a colocar o exemplo da empresa familiar no centro. Para mostrar que a empresa não existe para criar ricos, nem para fazer fortunas, mas para criar riqueza.
Os números são conhecidos. Contudo, se formos procurar literatura de gestão de empresas, aquilo que mais encontramos são textos baseados e dirigidos à gestão de empresas cotadas em bolsa, multinacionais, ou mesmo empresas controladas ou reguladas pelo Estado.
Se perguntarmos a um aluno de uma faculdade de gestão de empresas, qual a sua ambição de empregador, a probabilidade de nos depararmos por um tipo de escolha semelhante é muito elevada.
É, por um lado, natural que assim seja.
O desenvolvimento do estudo sobre a gestão de empresas recebeu sempre um maior apoio destas estruturas mais independentes dos proprietários e, durante muito tempo assistimos a uma reacção bastante retrógrada por parte das empresas familiares relativamente à aposta na formação e educação dos seus quadros e mesmo na convicção sobre o mérito da cientificação da gestão.
Ainda assim, passados alguns anos, a maioria das empresas familiares foram-se dando conta dos méritos indiscutíveis de uma evolução das competências dos seus colaboradores e da mais-valia que naturalmente obtinham no desempenho das suas empresas e na concorrência com os seus pares.
Hoje, depois de décadas de desenvolvimento da ciência de administração de empresas, recorrendo a técnicas das mais diferentes disciplinas, em que chegámos a níveis de produtividade muito mais elevados e em que a sua divulgação tornou a sua utilização muito democratizada, as universidades de gestão de empresas começaram a procurar aquilo que pode diferenciar a qualidade das diferentes organizações.
Focaram-se primeiramente no tema da governança, depois na ética e finalmente no ambiente e no ESG, para tentar encontrar uma forma de humanizar mais a empresa não a deixando tão exposta ao lado técnico da gestão.
Ainda assim, e apesar de haver claros movimentos de melhoria da intervenção das empresas na sociedade e de se poder afirmar que a qualidade do trabalho é hoje muito melhor, a verdade é que os objectivos em cada um dos momentos não foram atingidos com o nível de realização que seriam indispensáveis à transformação procurada.
O caso mais paradigmático foi o da governança quando, em 2008, no pleno momento de afirmação dessa nova realidade a nível mundial, foi nos exemplos em que essa governança se afirmava como o expoente da nova economia, que caiu uma das maiores crises financeiras baseada exactamente numa enorme falha dos conceitos de governança que afirmavam reger essas organizações.
Também o sentimos em Portugal aquando da queda da Portugal Telecom e BES, exactamente nas mesmas circunstâncias.
Também a aplicação de um código de ética nas empresas, ainda que possa ser muito bem elaborado e controlado, se for apenas feito com base nas teorias científicas da sua relevância, acaba, na maioria das vezes por se tornar um elemento de proibição de determinadas atitudes, sem qualquer integração da razão por que estas não devem ser tomadas e assim, deixa de funcionar como ética e passa apenas a ser um código de proibições.
Quanto a esta última transformação, a ambiental e ESG, ainda é cedo para se saber qual o seu verdadeiro impacto, contudo, pela experiência anterior, se não for acompanhado de algo mais profundo, dificilmente atingirá os seus objectivos.
Ora, aqui chegados, e em face dos comportamentos que vêm sendo verificados na sustentabilidade das empresas familiares versus as restantes empresas, seja na sua durabilidade, seja na sua integração social seja na sua participação junto das comunidades, os estudiosos de gestão de empresas têm vindo a procurar encontrar as razões dessas diferenças e as soluções que permitam a replicação dessas circunstâncias na vida das restantes empresas.
Neste sentido, é hoje um tema que começa a despontar nas principais escolas de negócio em todo o Mundo, um enorme interesse em estudar a realidade das empresas familiares.
No fundo, é apenas voltar ao princípio.
Como sempre, depois de uma grande evolução devemos regressar ao que foi a razão do projecto e, neste caso, compreender que as empresas foram feitas para as pessoas, pelas pessoas e com as pessoas, para melhorar a condição de vida de uma sociedade.
Para construir uma sociedade que se entre sustenta, em que todos são importantes e que devem ser defendidos.
Em que todos devem cooperar, contribuir e trabalhar e aonde todos devem encontrar o apoio para a sua realização como pessoas.
Por isso é tão importante voltar a colocar o exemplo da empresa familiar no centro.
Para mostrar que a empresa não existe para criar ricos, nem para fazer fortunas, mas para criar riqueza, com ela desenvolvimento para melhorar a qualidade de vida de todos.
Cada vez mais iremos assistir a uma retoma dos valores das empresas familiares nos processos de gestão das empresas e isso é uma excelente notícia.