observador.ptObservador - 19 jun. 00:20

Nacionalismo "reborn"

Nacionalismo "reborn"

Sim, precisamos de falar sobre a imigração. Sim, podemos e devemos ir tirando a temperatura ao turismo e garantir que continua a trazer um saldo positivo para o país. Mas nacionalismo? Saudosismo?

Espalhou-se por aí mais rápida e silenciosamente do que a moda dos bebés reborn; depois, perdeu a vergonha e começou a tornar-se ruidoso: o nacionalismo, senhoras e senhores, meninos e meninas, está de volta.

Não seria o movimento mais previsível num país que faz da autodepreciação desporto nacional, mas aconteceu. Com as agressões por motivações racistas a regressar, o discurso de ódio a crescer, as declarações xenófobas em alta, milícias armadas e o discurso sobre a imigração, que ainda há um ano era tóxico, a tomar conta do debate político. Mas não só; este – como chamar-lhe? – renacionalismo tem outro traço distintivo muito curioso: apanha os dois lados. Direita e esquerda. Um de forma mais agressiva, sem dúvida, outro de forma mais insidiosa, mas os dois, ainda assim. Dum lado, ameaça-se o imigrante, do outro, marcha-se contra o turista. Quem diria? Um cidadão incauto está, pacatamente, numa conversa e, de repente, ali aparecem elas, nunca se sabe de que lado: as terríveis, as violentas, as pareciam-tão-inofensivas-e-afinal-vai-se-a-ver-e-olha, saudades que eu já tinha da minha alegre casinha.

Dum lado, o skinhead; do outro, o mais demagógico indignado de esquerda que grafita, em bom inglês “Fuck tourists, go home!”, de preferência, na parede de algum lugar bem histórico da cidade. Uns e outros encontram-se, afinal, a meio do campo, na mais nuclear das idiossincrasias lusitanas: o saudosismo. Na cabeça de uns e de outros, construiu-se a ideia de que, antes, é que isto era bom, quando era só nosso, antes de cá terem vindo desvirtuar tudo, uns tirar-nos o trabalho, os outros a casa, ambos a empatarem-nos a vida e encarecerem-nos a dita, que já não era barata. Uma pessoa vai a uma urgência e só vê estrangeiros, queixam-se uns; uma pessoa vai ao Chiado e só vê estrangeiros, queixam-se outros (curiosamente, os de esquerda, sempre focada no que é realmente essencial na vida).

Não é que não haja razões de queixa dum lado e doutro – sendo que toda e qualquer sombra de razão se perde quando se tenta explicá-la com a ajuda duma soqueira ou biqueira de aço. Nenhum país absorve tranquilamente, como já aqui escrevemos uma duplicação da sua população imigrante em apenas três anos, muito menos um país economicamente débil, com uma crise na habitação e a braços com o esgotamento dos seus serviços públicos. Mas seria importante que estes patriotas saudosistas subitamente saídos do baú parassem para pensar o que foi que nos trouxe até aqui, quais foram os responsáveis e que alternativas temos.

Senhores, nós somos um povo que nem com dinheiro oferecido consegue gastar um cheque.

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