expresso.pt - 8 jul. 14:10
“A inovação não é só algo que chega cá, mas que o nosso país também produz”
“A inovação não é só algo que chega cá, mas que o nosso país também produz”
Acesso equitativo, financiamento sustentável, reforço de recursos e apoio a doentes e cuidadores estão entre as prioridades identificadas no relatório do projeto SHARP, da NOVA-IMS com apoio da Kite e o Expresso como media partner . Relatório foi conhecido esta manhã na Assembleia da República
Garantir que a inovação terapêutica chega a todos os doentes que dela precisam é fundamental, independentemente do peso financeiro ou das dificuldades na organização do sistema de saúde. Esta foi uma das principais conclusões da conferência que apresentou, esta terça-feira, o relatório final do Projeto SHARP – uma iniciativa do Nova Center for Global Health (NCGH), da NOVA-IMS com apoio da Kite, sobre os principais desafios na adoção e implementação das terapias celulares.
“O relatório fala muito numa dimensão essencial, que é a transparência e a justiça relativa que deve existir no processo de decisão”, sublinhou Mariana Vieira da Silva. A ex-ministra e atual deputada do PS foi uma de três representantes políticos a participar na sessão que decorreu no Auditório Almeida Lopes, na Assembleia da República. Para os eleitos, há um consenso: é preciso reforçar os recursos do sistema de saúde, ainda que isso não signifique necessariamente mais dinheiro. “A inovação pode ser barata, se for entendida não como um gasto, mas como um investimento”, apontou Francisco Sousa Vieira, do PSD. “A inovação não é só algo que chega cá, mas que o nosso país também produz", lembrou ainda Vieira da Silva.
Manuel Abecassis (APCL), Xavier Barreto (APAH), Tomás Lamas (Fundação Batazu) e Maria Gomes da Silva (IPO Lisboa) debateram os principais desafios e oportunidades das terapias celulares João GirãoNo centro da discussão está a apresentação do relatório com recomendações de dezenas de peritos – entre médicos, decisores políticos, responsáveis pela regulação e representantes de doentes – sobre a terapia à base de células CAR-T (recorde o artigo detalhado aqui). Atualmente disponível para um conjunto de doenças oncológicas, sobretudo ligadas a patologias do sangue, a expectativa é que, muito em breve, a tecnologia possa vir a ser aplicada em casos de doença autoimune e infeciosa.
“Enquanto órgão académico compete-nos gerar evidência, suportar com evidência científica aquela que pode vir a ser a decisão política”, resumiu Henrique Lopes, investigador do NCGH e um dos líderes deste projeto. Ao longo de cerca de “oito meses” de reuniões, debate e reflexão, os peritos analisaram os principais desafios na implementação desta terapia – disponível em Portugal desde 2019 – e elaboraram um conjunto de recomendações para melhorar o acesso, o financiamento e a evidência científica.
O segundo painel focou-se no acesso e no modelo de financiamento destas terapias, com a participação de Mariana Vieira da Silva (PS), Francisco Sousa Vieira (PSD) e Cláudia Estevão (Chega), numa conversa moderada pela jornalista da SIC Ana Peneda Moreira João GirãoHenrique Lopes e Laura Moura (NCGH) apresentaram os resultados da iniciativa SHARP, mas estiveram ainda presentes Maria Gomes da Silva (IPO Lisboa), Tomás Lamas (Fundação Batazu) e Manuel Abecasis (APCL), que participaram na mesa-redonda "Terapias celulares em perspetiva: desafios e oportunidades". A estes especialistas juntaram-se três deputados à Assembleia da República – Mariana Vieira da Silva (PS), Francisco Sousa Vieira (PSD) e Cláudia Estevão (Chega). Ricardo Baptista Leite, chair da NCGH, participou à distância através de um vídeo. “Precisamos de estratégias que incentivem a inovação”, pediu, lembrando que “acelerar a inovação não é uma escolha, mas uma exigência ética”.
Conheça abaixo as principais conclusões.
Recomendações do grupo de peritos
- Acesso mais justo e eficiente. Peritos defendem que é essencial uniformizar os critérios de referenciação e elegibilidade para a terapia CAR-T, para que todos os doentes com indicação clínica possam beneficiar do tratamento, independentemente da região ou hospital onde são seguidos.
- Investir em infraestruturas e profissionais. O relatório defende o reforço dos centros hospitalares com capacidade para aplicar esta terapêutica, nomeadamente ao nível dos equipamentos, das equipas clínicas e da formação especializada.
- Criar uma rede nacional de referenciação. De acordo com as recomendações, esta medida permitiria melhorar os percursos dos doentes, organizar os fluxos entre unidades hospitalares e otimizar os recursos existentes no país para assegurar melhor acesso.
- Financiamento claro e centralizado. A criação de um modelo de financiamento específico é vista como crucial, mas também importante para garantir maior previsibilidade orçamental e para superar o obstáculo do custo destas terapias celulares.
- Apoio efetivo a doentes e cuidadores. O relatório sublinha a importância de reconhecer e apoiar o papel do cuidador informal, nomeadamente através da revisão do seu estatuto. O apoio é essencial para garantir a adesão ao tratamento e o acompanhamento permanente dos doentes, sobretudo nos primeiros 30 dias após a administração da terapia.
Famílias e cuidadores precisam de mais apoio
- Tema central nesta discussão foi a importância de garantir uma rede de suporte aos familiares e cuidadores de doentes elegíveis para esta terapia. Até ao momento, são cerca de 200 as pessoas já tratadas com esta tecnologia, mas a necessidade de acompanhamento permanente, 24 horas por dia durante pelo menos 30 dias, é um dos maiores desafios.
- “É difícil, como pais, termos de nos deslocar para qualquer sítio, mas vamos e estamos disponíveis a fazer tudo”, apontou Tomás Lamas, presidente da Associação Batazu. O responsável conhece bem as dificuldades por ter sentido, na pele, o desafio de encontrar resposta terapêutica para o filho doente que acabaria por falecer. “É preciso criar condições paralelas para garantir a resposta”, disse.
- “A questão da equidade aflige-me muito”, confessa a hematologista Maria Gomes da Silva, do IPO Lisboa, que pede um reforço dos recursos humanos alocados aos quatro centros de referência que existem no país. Por outro lado, a criação de uma rede de referenciação nacional é vista como crucial para “centralizar decisões” e assegurar uma resposta rápida a casos que o exigem.
- A alteração do modelo de financiamento é, igualmente, uma questão central. “Apesar de não termos relatos de doentes que tenham deixado de ser tratados por isso, a realidade é que pode acontecer”, reconhece o deputado do PSD, que admite a possibilidade de revisão do instrumento.
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