Joana Andrade - 8 ago. 11:03
Não é inevitável a subserviência em política internacional
Não é inevitável a subserviência em política internacional
Não aconteceu assim quando Portugal decidiu, solitariamente a princípio, apoiar Timor-Leste: e este país e o seu povo ganharam a almejada independência.
Independentemente do que se pense sobre a racionalidade dos dictats dirigidos a diferentes países pelo presidente dos EUA, não podemos ignorar que tal atuação errática é perigosa e incompatível com um relacionamento normal entre estados soberanos.
É verdade que essa forma de atuação é, no imediato, menos nociva do que uma intervenção militar, mas corre o risco grande de a provocar.
De forma direta, como o fez no Irão, e de forma indireta, como municia o Estado de Israel para que este prossiga os mais desumanos massacres de civis em Gaza é, ele também, responsável por atos de guerra e de atrocidades indesmentíveis.
Sou do tempo em que, nos EUA, uma parte significativa dos jovens norte-americanos se insurgiam contra a intervenção militar do seu país no Vietnam e contra os bombardeamentos com napalm e pulverização com agente laranja (desfolhante químico altamente tóxico, prejudicial para o ambiente e a saúde humana), que a força aérea norte-americana, regularmente, fazia sobre o território e a população daquele país.
Hoje, porém, pouco sabemos sobre a existência de alguma significativa reação popular nos EUA contra os desmandos do poder.
Sabemos, sim, que o acordo sobre tarifas que a União Europeia teve de firmar com os EUA ficou dependente da satisfação, pela Europa, dos interesses económicos e militares deste país e que estes dependem da existência de um permanente estado de guerra.
Na verdade, tudo o que – reconheça-se a franqueza – parece orientar a presente atuação internacional dos EUA é, pura e simplesmente, a vontade de, por qualquer meio, voltar a dominar a vida económica do mundo.
Que o governo dos EUA diga com a frontalidade – e já sem o esfarrapado e hipócrita argumento da ajuda à instauração de democracias –, que é essa, afinal, a sua real motivação revela, apenas, o fim da falsa moralidade em política.
Mais absurdo parece ser, pois, o aplauso desta atitude dos EUA por parte daqueles que usam, internamente, na Europa, um discurso neonacionalista como instrumento de propaganda política.
Importa, portanto, dar a conhecer e explicar, de forma clara e objetiva, o que se passa realmente no mundo e as consequências que advirão para todos e, desde logo, para Portugal, se os desejos da potência imperial conseguirem vingar.
Nesta tarefa, cabe aos meios de comunicação social um papel importante, para não dizer decisivo.
A eles e aos seus profissionais compete divulgar com objetividade, sem preconceitos e submissões, a verdade que estamos todos a viver.
Por exemplo: explicar como e de que modo vai o acordo assinado pela Sr.ª Von der Leyen afetar a nossa economia?
Que governos de países da UE aceitaram e aprovaram, afinal, o teor de tal acordo e por que razão?
Que parlamentos foram – já não digo consultados – informados sobre o teor e condições de tal acordo?
Que valor legal tem ele?
Muito do descrédito que recai, hoje, sobre os governos e instituições ocidentais resulta, precisamente, da sua dúplice atitude.
Hoje, mais do que nunca, parece diminuta a força dos que – com razão ou sem ela – são considerados, na Europa, os inimigos do Ocidente.
Como é, pois, possível encher, por exemplo, a boca com a iminente invasão russa e noticiar todos os dias as enormes dificuldades que o seu exército demonstra na guerra que trava com um único país claramente mais fraco militarmente?
Como é possível, ainda, condenar as mortes e destruição ocorridas em tal guerra e não criticar, também, com igual veemência, as ainda mais letais barbaridades que Israel comete, todos os dias, contra civis em Gaza?
Tais dissonâncias só ajudam a desacreditar, também no plano interno, as forças que se arrogam da democracia e da defesa dos direitos humanos.
Coerência e coragem para defender, intransigentemente, os direitos de todos, são, pois, fundamentais para derrotar o partido do negócio da guerra e garantir uma paz justa para os diferentes povos.