José Couto Nogueira - 9 ago. 08:46
Tarifas para gregos e troianos
Tarifas para gregos e troianos
Esta quinta-feira, dia 7, entraram finalmente em vigor os impostos de importação da maioria de países para os Estados Unidos. Os resultados são previsíveis....
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Passa uma semana e lá estou outra vez a falar de Trump e das famigeradas tarifas. (“É o que temos”, dizem os eternos submissos portugueses, mas agora quem tem é praticamente quatro quintos do mundo.) Desde o dia 2 de Abril deste ano que o Presidente disse que ia taxar tudo o que entrasse nos Estados Unidos, uma vez que as importações representavam um travão ao desenvolvimento do país e um roubo para o consumidor. Entre 2 de Abril e 7 de Agosto, esta opinião manteve-se, mas o valor das tarifas e os atingidos por elas mudaram com acordos bilaterais, pedidos de clemência, opiniões políticas e estado de humor do Rei Norte-Americano.
Como disse Paul Krugman, citado na crónica da semana passada, “O âmago da questão é que toda a guerra comercial de Trump se baseia numa ilusão sobre o funcionamento da economia mundial.” Ou seja, não é preciso ser Prémio Nobel de Economia para perceber que quem realmente vai pagar este aumento de impostos é o consumidor final americano. Os exportadores, quando muito, vão vender menos, porque os seus produtos e serviços ficaram mais caros, mas têm sempre a opção de vender para outros mercados.
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Assine a nova newsletter do 24notícias aqui.Mas então, se Trump não percebe nada de Economia, porque é que tomou esta decisão? Por uma ilusão que ninguém lhe tira da cabeça, por vingança e amor ao confronto e porque satisfaz o seu narcisismo mórbido – falem mal de mim, mas falem.
Não é a primeira vez na História que um Soberano e/ou os seus súbditos fazem asneira grossa, como, por exemplo, a política de natalidade imposta por Chi Jin-ping, ou o Brexit. Mas desta vez a asneira pune o mundo inteiro, uns directa outros indirectamente. Talvez seja a primeira vez que o acto é uma vingança política, como a taxa de 50% imposta ao Brasil por estar a culpabilizar o ex-Presidente Bolsonaro pela sua tentativa de golpe de Estado. (Convém lembrar que Trump amnistiou todos os participantes no seu golpe de Estado.)
Algumas tarifas são realmente surpreendentes, como os 39% aplicados à Suiça. Será que se vendem assim tantos relógios e canivetes nos Estados Unidos? Não é por isso, e assim ficamos a saber que os suíços exportavam 4,5 mil milhões de ouro em barra para a Trumplandia, mas em 2024 passaram a mandar 12,4 mil milhões e só nos primeiros cinco meses deste ano 48 mil milhões. Este aumento até foi provocado pelo próprio Trump; a incerteza provocada pela sua política económica levou a que os fundos de investimentos e milionários norte-americanos comprassem mais ouro, como garantia contra o imprevisível. (Se quiser saber os pormenores, estão aqui.
Não é preciso ter dois anos de estudo no ISCEF (o meu caso) para perceber que se o ouro vai custar mais 39%, isso significa uma desvalorização equivalente do dólar – são precisos mais dólares para comprar o mesmo ouro. Mas adiante.
Não vou colocar aqui a enorme lista dos 200 países do mundo e respectivas tarifas. (Está aqui, para quem queira saber.)
A mais alta, 50%, é precisamente para o Brasil, porque são uns marxistas empedernidos que querem fazer mal ao colega Bolsonaro. O Canadá, país amigo, apanha com 35%, porque trafica a droga fentanil (mentira) e porque Trump gostaria de o anexar e, não podendo, faz-lhes a vida difícil. O México, o outro parceiro fronteiriço – os três formam um bloco económico chamado U.S.M.C.A. – ainda está em negociações. A Europa, como sabemos, ajoelhou e beijou o anel, ficando assim com um aumento simpático de 15%. O mesmo que O Reino Unido, Vietname, Filipinas e Japão. A Indonésia, por motivos que ignoro, apanha com 19%. Os poucos países cujos líderes são compinchas ideológicos mantêm a taxa base de 10%. Também a Ucrânia beneficia deste valor, exactamente pela razão oposta: está ser atacada por um compincha ideológico.
Depois, ainda há o caso dos produtos que levam um extrazinho porque... vá lá saber. O aço, 50%, alumínio, 50%, automóveis e peças para automóvel, 25% (metade dos carros comprados nos Estados Unidos são importados), peças em cobre (mas não o cobre em bruto) 50%. Quer dizer, estes aumentos são em cima dos aumentos gerais para o país exportador. No caso da UE, um Mercedes iria pagar de taxa de importação os 15% europeus mais 50%. Ou talvez não, seja apenas mais 15% sobre os 15% básicos. É difícil acompanhar as mudanças constantes desde 2 de Abril, o chamado “Dia da Libertação”, querendo a expressão dizer que o país se ia libertar da roubalheira indecente perpetrada por países que se diziam amigos, mas afinal só queriam diminuir o PIB norte-americano.
É importante pensar que nada disto é definitivo e pode mudar ao sabor do humor trumpista. Por exemplo, a China pagava 145% em Abril e agora, graças a graciosas conversações, passa para os 30%. A Índia verá a sua percentagem duplicar se continuar a comprar petróleo russo nos próximos três meses.
Mas tudo isto é temporário e sujeito a novas negociações. Ou seja, imprevisível. O que é previsível é o aumento do custo de vida em geral, uma vez que o aumento artificial do custo de um produto vai em cascata do fabricante para o importador e do importador para o vendedor, até cair no colo no comprador final.
O mais certo é que daqui a três meses – ou três semanas, os números já sejam outros.